Imigrantes em RO: venezuelanos lutam contra o desemprego em Porto Velho



A chegada de um imigrante a um novo país é rodeada de desafios. A adaptação a uma nova cultura, estrutura social e estatal pode demorar para acontecer. No entanto, para a maioria deles, a conquista de um trabalho é algo que não pode demorar muito.


O retrato dessa espera pode ser visto em algumas avenidas e ruas movimentadas de Porto Velho. Hoje em dia, a maioria são venezuelanos segurando cartazes com pedidos de ajuda. Outros vendem, sob forte calor, panos de prato e água mineral.


Conforme a Cáritas Brasileira em Porto Velho, dos 105 venezuelanos que pousaram em Porto Velho no início deste ano, apenas 35 já estão empregados. A grande maioria sem carteira assinada. Do total, 17 já foram para outros países, 30 são crianças ou adolescentes e 23 seguem em "processo de organização de decisão".



Dos últimos 36 que chegaram em julho deste ano na cidade, nenhum conseguiu trabalho e seguem em busca de uma oportunidade.


Na Avenida Nações Unidas, por exemplo, duas primas venezuelanas esperam o retorno do sinal vermelho para andarem entre os carros segurando uma placa de papelão com os dizeres "Eu venezolana preciso uma ajuda de voces".


Primas venezuelanas pedem dinheiro em avenida de Porto Velho para complementar renda. — Foto: Pedro Bentes/G1


Além da esperança de conseguir alguns trocados, as duas primas compartilharam um feito: ambas estão grávidas.


Yoelis de Carrasquel, de 19 anos, espera seu segundo filho. Com seis meses de gravidez, a venezuelana, na companhia de sua prima Aiderlin Chaparro, de 15 anos, desafia o sol e o calor de Porto Velho para complementar a renda.


Com um aluguel de R$ 400 e conta de luz que chega aos R$ 200, a jovem venezuelana teme todos os meses não conseguir fechar o orçamento. A conquista de um emprego fixo e registrado, segundo ela, evitaria isso. Só que a gravidez e a nacionalidade, segundo ela, parecem grandes empecilhos.


"Imaginamos que uma empresa não vai aceitar uma grávida, por temer todos os gastos com uma barriga. Então fazemos diárias (em lares), mesmo sendo muito pouco. Se for uma casa grande dividimos o (lucro) que ganhamos. Muitas pessoas nos ajudam com alimentos", descreve Yoelis.


A arrecadação em média nos sinais, segundo as venezuelanas, não passa de R$ 50,00 por dia.



Aiderlin à esquerda e Yoelis à direita. Primas venezuelanas pedem dinheiro em cruzamento de Porto Velho. — Foto: Pedro Bentes/G1



Quem contrata


Mauricélia é proprietária de um restaurante em Porto Velho. Entre os seus funcionários, ela tem uma venezuelana e uma cubana, ambas auxiliares de cozinha. A decisão de contratar duas imigrantes, segundo Mauricélia, partiu primeiramente de uma questão humanitária.


"Primeiro pela questão social, da situação (dos venezuelanos). Mas aí você pensa. Como uma pessoa se compadece com uma imigrante, enquanto há tantos brasileiros desempregados. Só que com os brasileiros a gente tenta, mas eles têm problemas em trabalhar aos domingos, enquanto os venezuelanos são mais dispostos. Não sei se pelas condições", disse.



"Aqui na minha empresa nós temos uma assessoria jurídica e elas (imigrantes) são contratadas mediante a CLT. Tudo certo com contrato de trabalho", explicou a proprietária.


Em um outro cenário, Mauricélia diz que alguns colegas de profissão optam por não contratar imigrantes como funcionários. Entre os receios, estão o temor de dificuldade de adaptação entre diferentes culturas.


"De início, uma de nossas funcionárias se sentia muito ofendida por pedirmos as coisas sem 'por favor'. De início, parece uma coisa boba, mas que é uma questão de cultura, de valor para ela. Mas hoje a adaptação já está boa", compartilhou a proprietária.



Migração 'acostumada'



Protagonistas de um ciclo migratório anterior, os haitianos, por exemplo, ocupam atualmente 29 vagas de gari-coletor na empresa responsável pela coleta de resíduos de Porto Velho. Já de venezuelanos há três vagas da mesma função ocupadas. Entre os haitianos contratados estão Sapalson Gelim, de 29 anos, e Rony Fortilus, de 33 anos.


A realidade de Sapalson é bem diferente de oito anos atrás. Sem perspectiva de vida, o jovem resolveu imigrar no Brasil. Nessa época, o Haiti estava em meio a uma reestruturação social depois que um terremoto deixou 300 mil mortos e destruiu grande parte do país tempos antes.


Os haitianos Sapalson e Rony, respectivamente. — Foto: Mayara Subtil/G1

"Precisava ajudar minha família, mas não via outro meio a não ser mudar de país. Passei pelo Equador, depois Peru e por fim, Acre. Lá (estado acreano) passei dois meses. Consegui lá meu CPF", explicou Sapalson.


Com o trabalho, Sapalson consegue ajudar a companheira com as despesas da casa, depositar dinheiro ao filho, de 3 anos, que mora no sul do país, e reforçar a renda da mãe, que ainda vive no Haiti. Ele não a vê desde que se mudou para o Brasil.


"Não sobra nada. Vai tudo para a família. Tem mês que eu deposito R$ 300 ou até R$ 400 para ela (mãe). Mas isso é gratificante, pois no Haiti tudo é caro. A carne que se compra no mercado é cara. Então tenho que trabalhar para ajudar. Tem que ajudar a família", explicou o haitiano.


Amigo e companheiro de trabalho de Sapalson, Rony completou quatro anos de moradia no Brasil no mês passado. Graças ao serviço que faz nas ruas da capital, ele conseguiu juntar dinheiro para fazer a mudança da esposa do Haiti ao território brasileiro.

Eles conseguiram trabalho em uma empresa de coleta de lixo em Porto Velho. — Foto: Mayara Subtil/G1



Hoje, segue juntando mais dinheiro para trazer os dois filhos do casal que ficaram no país: uma menina, de 7 anos, e um menino, de 5 anos. "Quero trazê-los para cá. Aqui é bom. O Brasil é meu lar agora e não penso em voltar. Só de passagem, que é cara", disse, aos risos.



"Não dá para viver no Haiti. Do deixo que está lá, pode chegar ao ponto da Venezuela. Não está bom, o governo não está bom. Consegui trazer minha mulher e agora vou trazer meus filhos", disse Rony.




Parte do dinheiro que Rony ganha como gari vai para os estudos dos filhos. Caso consiga trazer as crianças ao Brasil, vai matricular as duas em instituições públicas. "Aqui tem educação pública. É acessível. Eu não vou deixar meus meninos sem estudo. Eu não tive, mas eles vão ter", frisou o haitiano.



Fonte: G1