Mesmo com esclerose, servidora do Judiciário lutou para trabalhar até último dia de vida


Conhecida principalmente por sua inteligência, marcou todos que a conheceram. Com capacidade de terminar uma minuta de sentença em 50 minutos, iniciou a carreira no Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) como assessora comissionada na 5ª Vara Cível da comarca de Porto Velho, em 2002. Ali, conheceu o juiz Ilisir Bueno, uma parceria que duraria anos.

Foi o próprio magistrado que a incentivou a prestar concurso para o Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO). Ela passou em 2º lugar, no ano de 2005. “Pérola sempre foi muito produtiva e responsável. Exemplo de dedicação e superação. Diante de todas as dificuldades, nunca deixou de sorrir e valorizar as coisas boas. Sempre transmitiu seus conhecimentos a todos que a procuravam. Era uma pessoa muito especial”, contou o magistrado.


Assim que passou no concurso, a servidora foi lotada na 5ª Vara Cível, à época titularizada pelo magistrado José Jorge Ribeiro da Luz, atual corregedor-geral da Justiça. Ela ficou três meses na unidade, antes de voltar a trabalhar com o doutor Ilisir Bueno, que havia sido promovido a titular da 7ª Vara Cível.

“A Pérola foi uma das melhores alunas que eu tive na faculdade. Brilhante mãe, exemplo para todos. Mesmo doente era a melhor assessora do Fórum Cível, produzia mais do que os outros assessores. Só trabalhou comigo por pouco tempo porque Ilisir não abriu mão dela”, contou o magistrado.

Pérola foi para a 7ª Vara Cível em agosto de 2005. A doença já começava a demonstrar sinais. Uma estagiária chamada Aline Guterrez foi a pessoa designada para auxiliar a assessora no manuseio dos processos, livros e digitação. Atualmente assessora jurídica na Corregedoria, Aline lembra da amiga com emoção. “Ela era minha amiga. Ela me ajudava, eu ajudava ela. Ela me ensinou tudo o que eu sei. Era um ser humano maravilhoso, profissional fora da média, excelente”, contou a servidora.


Aline chegou a acompanhar o processo de Pérola em conseguir trabalhar em casa, na modalidade home-office. Com estágio avançado da esclerose, Pérola não conseguia falar ou se movimentar, mas trabalhava utilizando um equipamento que permitia escrever com o movimento dos olhos. Jamais cogitou se aposentar.

“Ela conseguiu autorização mostrando determinação, vontade e, acima de tudo, a capacidade de trabalhar. Ela lutou muito e mostrou que podia usufruir desse direito sem prejuízo para os trabalhos da Vara. E honrou isso até o fim”, contou Aline Guterrez.

Pérola teve deferimento de home-office em maio do ano passado. Foi designado um grupo de trabalho para avaliar a capacidade laborativa e condições da servidora. Ela tinha carga de quatro horas diárias e era reavaliada a cada 30 dias, por meio de relatórios emitidos pelo juiz responsável pela Vara. Pérola cumpriu todas as metas.

O filho dela, Lucas Juraszek, conta que a mãe manteve a rotina de ir ao trabalho na 7ª Cível até o momento que não pode mais conseguir respirar sem auxílio de aparelhos. Chegou a fazer um curso de francês para aprender a falar o idioma do país onde a irmã reside, Suíça e ficava “extremamente estressada” quando a família não podia levá-la ao trabalho. Após um procedimento de traqueostomia, os médicos chegaram a dizer que não resistiria. Semanas depois, Pérola melhorou e retornou para casa e a família.

“Imediatamente ela procurou meios para trabalhar novamente, se atualizar com o novo Código de Processo Civil. E ainda conseguia cuidar de todos na casa, mesmo deitada em uma cama. Sabia onde precisava limpar a casa, pois as funcionárias tiravam fotos para ela verificar. Apontava o que precisa ser substituído, comprado, decorado. Todos os dias queria saber como estava o neto e se eu viria almoçar em casa. A única diferença dela para as demais pessoas, era simplesmente a capacidade física de se locomover, se alimentar e respirar. Mas era extremamente dedicada ao lar e família”, lembrou Lucas Juraszek.

O vice-presidente da Escola da Magistratura de Rondônia, Guilherme Baldan, também lamentou o ocorrido. “Trabalhei com ela durante dois anos, enquanto substituí na 7ª Vara Cível. Ela ensinou a todos nós com simplicidade, sorriso estampado e extrema inteligência”, disse.

O assessor de desembargador, Kleber Gonçalves, também homenageou a servidora. Ele foi amigo de Pérola na época em que trabalhava na 4ª Vara Cível. “Ela sempre foi muito prestativa. Três características muito marcantes: inteligencia, dedicação ao trabalho e família e bom humor. Pérola, você marcou a todos nós. Não te esqueceremos”, finalizou.

O servidor Carlos Henrique Capelasso conviveu com Pérola desde 2009 e acredita que ela representava um mix de lições e aprendizados. Ele tinha 19 anos quando começou a trabalhar na 7ª Vara e diz que ganhou uma professora particular da matéria “Como viver a vida e elaborar decisões sobre a vida das pessoas”.

“Ela chegou a iniciar uma cartilha para portadores da esclerose, informando os direitos de que dispunham. Eu a ajudei em muitas coisas pequenas do cotidiano e acompanhei muitos dos processos que a doença impunha. Mas também perdi as contas de quantas vezes rachamos de rir por conta das situações, processos, piadas. Com toda a rigidez e foco na produtividade que ela tinha, posso dizer que os anos que passei na 7ª Vara construíram quem sou hoje. Ela moldou minha organização pessoal, redação, modo de encarar e analisar os processos”, contou. Carlos foi amigo de Pérola até os últimos dias. Mesmo após a servidora começar a trabalhar em casa, ele a visitava sempre que podia.


Velório e sepultamento


O velório de Pérola será no Cemitério Jardim da Saudade, na sexta-feira (7), a partir das 8h. O sepultamento deve ocorrer às 11h30.


Portaria 7ª Vara Cível

Em razão do velório e enterro, os servidores da 7ª Vara Cível terão expediente suspenso na sexta-feira (7), no período de 07h às 13h. A medida será oficializada por meio de Portaria a ser publicada no Diário da Justiça Eletrônico (DJe).

Fonte: Rondoniaovivo